Jessica Jones - Netflix e Marvel no caminho certo
Tenho dificuldade pra acompanhar tudo que curto. Tendo uma esposa que também curte filmes e séries e cultura pop em geral, mas que também trabalha e que tem horários que não batem tanto com os meus, e uma filha que também já curte bastante coisa geek, especialmente de super-heróis, porém tem apenas 4 anos e meio, o que poderia ser uma vantagem torna-se uma complicação. Se começo uma série com minha esposa e ela curte, precisarei esperá-la pra assistirmos juntos. Daí, quando temos tempo e não temos outros programas, precisamos contar também que será algo que possamos assistir na presença da pequena, já que não queremos expô-la a conteúdo inadequado à sua idade. Fora outras questões, como cansaço, clima, e outros fatores aleatórios que podem influenciar na vontade de ambos de assistir algo específico. Em resumo: é muito difícil!
Foi assim com Demolidor. Adoramos a série logo de cara. Eram apenas 13 episódios. Nossos amigos estavam falando sobre isso. Só se falava disso na internet. Demoramos, sei lá, seis meses pra assistir aos episódios (que foram lançados todos de uma vez, só pra constar). Isso porque gostamos MUITO. E meio que maratonamos os últimos episódios (o que dentro das nossas possibilidades é, tipo, sei lá, uns 4 episódios).
Apenas a séries de heróis do catálogo Netflix. É muita série pra acompanhar e pouco tempo pra viver!
Além disso tudo, sou um pouco metódico quanto a séries (especialmente as interligadas). Assisto tentando seguir alguma lógica. Por exemplo, pra poder assistir The Flash, comecei assistindo Arrow. Afinal, quando chega no final da segunda temporada, Barry Allen aparece e as histórias se cruzam. Quando começa a terceira, surgem os crossovers. Daí, assistimos assim: um episódio de Flash e outro de Arrow. Pois sabíamos que se não fosse assim, teríamos spoiler de uma série na outra. Dessa forma, assim que acabei a primeira temporada de Demolidor (quando todo mundo já tinha até terminado a segunda), fiquei doido pra assistir Jessica Jones. Além de ter sido muito comentada e aclamada pela mídia especializada, tem essa questão de assistir as coisas em ordem. Afinal, JJ foi lançada meses depois da primeira de DD e prepara o campo para Luke Cage, que estreia no fim desse mês de Setembro.
Lá fui eu, achando que teria a mesma pegada de Demolidor. Violência, testosterona e combate ao crime nas ruas de Hell's Kitchen, possivelmente com mais conexão com o restante do Universo Cinematográfico Marvel. Ledo engano. Certamente essa impressão equivocada se deve pelo fato de, mesmo sendo um marvete de carteirinha, não conhecia absolutamente nada sobre a personagem. Sim, me julguem, nunca li nenhuma HQ Alias (aventuras solo de Jessica nos quadrinhos). Não sei porquê. O fato é que não fazia ideia do que Jessica poderia me trazer. E isso foi ótimo.
Jessica Jones faz uso de sua classificação etária de 18 anos, mas de forma diferente. Em Demolidor, existem cenas de muita violência, mutilação e uma temática 'adulta', como tráfico de drogas e de pessoas, máfia e coisas do tipo. Já em JJ, essa classificação é utilizada, a princípio, com cenas de nudez (nada explícito), bastante sangue e mortes chocantes, mas sem a violência de DD. Entretanto, a temática é bem diferente. A violência aqui está bem mais próxima da realidade feminina: relacionamentos abusivos, bulimia, exploração infantil, aborto e especialmente, estupro.
Jessica é uma mulher forte (literalmente, até) que vive com um trauma. É muito independente, dura na queda, desbocada e muito sexy .
Parece ser o que se chama de 'mulher moderna', mas ao mesmo tempo, gosta das pessoas, dos amigos e se apaixona. Pra quem vê de fora, parece um símbolo estereotipado das feministas. Pra quem sabe o que é o feminismo, de verdade, sabe que ela o representa bem, e não é nada estereotipada ou forçada. Inclusive, o feminismo, aquele sério, é extremamente forte na série. Especialmente na forma como Jessica procura usar seus poderes, quase que instintivamente, ela acaba defendendo mais as meninas/mulheres e as minorias, de uma forma de geral. Até nos personagens, acredito que há um balanceamento justo na quantidade, no que diz respeito a gênero.
A protagonista hoje tenta levar vida como investigadora particular, após ter tentado por algum tempo ser uma super-heroína (além de força sobre humana, ela também pode 'quase voar', o que ela prefere chamar de 'saltos longos'). Ela tem uma melhor amiga que também teve um passado conturbado. A relação dela com essa melhor amiga vai se desenrolando ao longo da série. Assim como todos os outros itens que compõem a personagem. Achei muito boa essa forma de contar a história. Não é o flashback clássico, que está na moda. Aos poucos, tudo vai se esclarecendo de forma bem natural, sem se preocupar muito em explicar detalhadamente, na medida certa pra que o espectador entenda e tire conclusões. Da mesma forma, os outros personagens vão se apresentando. O vizinho que sofre com dependência de drogas, o casal de irmãos que tem relação no mínimo estranha (além de serem também estranhos por si só), a menina que comete um crime terrível, vai pra cadeia por isso e somente Jessica sabe que ela é inocente, porém, provar isso é quase impossível, além da excelente advogada que vez ou outra utiliza os serviços de Jessica e assim, uma fica devendo favores a outra.
Todos personagens tem sua importância na história e são muito bem explorados e têm certa profundidade. Mas dois se destacam mais, além de Jessica: Luke Cage e Kilgrave. O primeiro, é um personagem já conhecido pra quem acompanha HQs. Luke fez/faz parte dos Vingadores desde que a equipe se reformulou, lá na época da Guerra Civil. Na série, ele se apresenta de uma forma bem interessante e se acaba se mostrando essencial ao longo da temporada. Acaba sendo quase que um sidekick de Jessica. Seus poderes são muito úteis e bem utilizados. A caracterização está ótima (tudo bem que sua 'roupa de herói' desde muito tempo, se resume a uma camisa amarela, braceletes e calça jeans/preta. Me refiro ao ator que foi escolhido e sua interpretação). Agora, o segundo... ah meu amigo! Esse sim! Kilgrave é o cara da série! Pra mim, o melhor vilão desse MCU até agora. Juntando tudo, desde Homem de Ferro 1.
Além de tudo, o cara sabe xingar... BTW, só eu acho ele parecido com o Danilo Gentili?
A princípio, eu achei ele bem bosta, confesso. O cara tem um poder incrível e se limita a usá-lo apenas pra encher o saco de uma garota? No fim da história, eu ainda achei que ele poderia fazer melhor uso desse poder, mas pelo menos entendo suas razões. O cara é um maníaco obsessivo e possessivo. Ele tem a visão distorcida e acredito que nem tem tanta noção do poder que tem, tamanha a cegueira de sua obsessão. Mesmo assim, ele é o responsável pelos momentos mais tensos da série e dá medo. Por mais que o Rei do Crime, por exemplo, também consiga se impor e também dá medo, Kilgrave faz isso com mais frequência e intensidade. Como já vi alguém dizendo em algum lugar por aí, os roteiristas dos filmes da Marvel (e se pá, até da Warner/DC) deveriam fazer um curso com os das séries Marvel/Netflix sobre como construir um bom vilão. Não apenas pelo que são hoje, mas por tudo que os levou até ali e mostrando que suas falhas, os humanizam e aproximam da nossa realidade.
No fim das contas, a série é MUITO interessante e vale muito a pena ser assistida. Por todos, não apenas por quem curte super-heróis. A carga dramática da série é muito forte, intensa. Tem sua dose de humor. Tem uma trama bem elaborada e amarrada. Personagens fortes. Pra quem curte e acompanha o Universo Marvel, é ainda mais válida, pois trás um tom diferente de tudo que tem ao seu redor, inclusive de Demolidor, conforme já citei. Outro item que vale citar, é o fato de a série ter muitas expressões, gírias e vocabulário em geral interessantes a quem gosta de conhecer e/ou estuda Inglês.
Recomendo a todos. E não façam como eu, se puderem. Assistam logo! Até porque, Luke Cage tá aí batendo (derrubando?) na porta, então, um background antes de começar uma série nova é sempre bem vindo. E quando tem Marvel e Netflix envolvidos, já está confirmado que podemos e devemos confiar.